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TEOLOGIA SISTEMÁTICA 02-03 A TRINDADE

A TRINDADE

Professor Whitson Ribeiro da Rocha

 

INTRODUÇÃO

            A palavra “Trindade” não se encontra na Bíblia, mas é a única fórmula que respeita os dados bíblicos. Estudaremos aqui primeiramente como esta doutrina está arraigada nas Escrituras e depois como ela se desenvolveu historicamente na Igreja.

A TRINDADE CONFORME REVELADA NAS ESCRITURAS
1)      DEFINIÇÃO
A definição clássica de Trindade é: Deus é um em sua essência (ousia/substantia) e três em personalidade (hipóstases/persona).

2)      O PARADOXO DA TRINDADE
Há duas verdades ensinadas de modo paralelo na Bíblia:
1º) Há um único Deus: Dt 6.4; 4.39; Is 43.10-13; 44.6; 41.4; 45.5; Mc 12.29,30; Jd 25.
-          Israel era o único povo monoteísta no meio de tantos povos politeístas;
-          a igreja sempre se viu como a continuadora da fé do Antigo Testamento: ela adora o único Deus de Israel.

2º) Há três pessoas na condição de Deus:
-          a divindade do Pai: Jo 1.14; 5.17,18; 8.54;
-          a divindade do Filho: Jo 1.1; 20.28; 8.58,59; Rm 9.5; Fl 2.6,10 cp. Is 45.21,23; Tt 2.13; I Jo 5.20;
-          a divindade do Espírito Santo: At 5.3,4; I Co 3.16; II Tm 3.16 cp. II Pe 1.21.

3)      A TRINDADE NO ANTIGO TESTAMENTO
Por que não há esta clareza sobre o ensino da Trindade no Antigo Testamento?
-          por causa do politeísmo da época;
-          revelação progressiva do simples ao complexo;
-          Deus não se revelou de forma abstrata, mas através de atos redentores;
-          a vinda de Jesus Cristo ao mundo é que trouxe a revelação clara do Deus trino.
Mesmo assim observe no Antigo Testamento:
-          Deus cria por meio da Palavra e do Espírito: Gn 1.1-3; Jó 33.6;
-          quando vai colocar sua imagem no homem, Deus dialoga em forma plural: Gn 1.26;
-          o Anjo do Senhor é identificado com Javé e recebe adoração: Gn 16.7,9,13; 31.11-13; 48.15,16; Ex 3.2-4; Jz 13.21,22;
-          personificação da Sabedoria e Palavra divina: Pv 8.22-31; Jó 28.20-27; Sl 119.89;
-          referências ao Messias: Is 9.6; Mq 5.2; Sl 110.1; 45.6,7; Ml 3.1;
-          referências ao Espírito Santo: Gn 1.2; 6.3; Ex 31.3; Nm 11.24-29; Jz 3.10; Is 11.2; 32.14-17; 42.1; 48.16; 61.1; Ez 36.26,27; Jl 2.28,29;

4)      A TRINDADE NO NOVO TESTAMENTO
A verdade sobre a Trindade está mais fácil de ser percebida no Novo Testamento. Por quê? Sem dúvida é a pessoa e presença de Jesus Cristo que traz à tona toda a construção do conceito de Trindade. Esta doutrina é plenamente escrita pela Igreja para responder à seguinte pergunta: Jesus Cristo é Deus? Se ele é Deus como entender que há um Pai com quem ele fala e a quem serve e um Espírito que o guia e que depois ele o envia?
Por causa disso há alguns textos no Novo Testamento que não se entendem sem a formulação da doutrina da Trindade.
A Trindade é apresentada de forma clara no NT:
-          Fórmulas trinitárias no NT: nascimento (Lc 1.35), batismo (Mt 3.16,17; Lc 3.21,22), a grande comissão (Mt 28.19), a bênção apostólica (II Co 13.13).
-          Textos trinitários no NT: Jo 1.1, 2, 18, 32-34; 8.58,59;  10.30-33; 14.9-11,16; 16.13-15; 17.5,11,21,22; I Co 8.4-6; Fl 2.5,6; Ap 1.4-8.
-          Distinção entre as pessoas divinas:
-          entre o Pai e o Filho: Jo 5.32,36,37; 1.14; 3.16; 10.36; Mc 15.34; Gl 4.4
-          o Espírito Santo distinto do Pai e do Filho: Jo 14.16,17,26; 15.26

A FORMULAÇÃO DA DOUTRINA NA HISTÓRIA DA IGREJA ANTIGA
      A formulação da doutrina da Trindade foi uma necessidade na história da igreja pois começaram a aparecer heresias que negavam a divindade de Jesus Cristo. A igreja começa a se perguntar acerca de como é o Deus revelado em Cristo e nas Escrituras.
A definição que a igreja deu com relação à Trindade no Concílio de Nicéia em 325 d.C. permanece até hoje como a declaração da fé da igreja cristã acerca de seu Deus.

1)      OS PAIS APOSTÓLICOS (século II d.C.)
Os pais apostólicos não discutiram a questão da Trindade até porque não houve necessidade visto o seu ensino estar muito próximo no tempo ao dos apóstolos. Eles criam: em um único Deus; empregavam a fórmula trinitária, especialmente no batismo; Jesus é chamado de Deus (Inácio).

2)      OS PAIS APOLOGISTAS (século II d.C.)
Os pais apologistas também não entraram nesta discussão, mas tinham a visão de Cristo como o Logos de Deus que é a razão pela qual Deus faz e dá estrutura a este universo.

3)      TERTULIANO DE CARTAGO (fim do século II d.C.)
-          foi o primeiro teólogo a usar o termo “Trindade”;
-          Cristo é o Logos, é um com Deus, mas distinto do Pai (ex.: sol, raio, calor)
-          ensinou o “subordinacionismo”: o Filho está subordinado ao Pai, o Pai é sempre maior, o Pai gera;
-          uso dos termos latinos: “persona” (indicava independência) e “substantia” (essência), desta forma ele usa a fórmula: uma substância e três pessoas;
-          rejeitou a idéia do “patripassionismo”: o Pai sofreu na cruz.

4)      MONARQUIANISMO (fim do século II d.C.)
Os mestre monarquistas rejeitavam o conceito trinitário de Deus. Havia apenas um Deus que era apenas uma pessoa. O monarquianismo foi de dois tipos diferentes.
-          Dinamista (Teodoto de Bizâncio)
sobre o homem Jesus veio, por ocasião de seu batismo, o poder (dynamis) de Deus e ele se torna o Cristo, um ser divinizado.
-          Modalismo (Paulo de Samosata e Sabélio)
-          Pai, Filho e Espírito Santo são de uma só substância e não podem ser diferenciados;
-          as três pessoas são modos do único Ser Divino se apresentar na história.

5)      A IGREJA (fim do século II e início do século III d.C.)
Neste tempo a maioria da igreja cristã aceita os princípios trinitários:
-          consubstancialidade do Filho com o Pai (uma “ousia” ou “substantia”);
-          três pessoas independentes (três “hypóstases” ou “personas”)



6)      ÁRIO DE ALEXANDRIA (século III d.C.)
-          Deus é uno, indivisível e não comunica nada de seu Ser a ninguém, logo o Filho é parte da criação;
-          Cristo é menor do que Deus e maior que o homem;
-          negava a pré-existência de Cristo: “houve tempo em que ele não existia”;
-          os atributos divinos dados a Cristo nas Escrituras eram funcionais, como honra que Deus lhe dava.

7)      ATANÁSIO (século III d.C.)
O diácono Atanásio foi ferrenho opositor de Ário e o grande defensor da Trindade. Seus argumentos contra o ensino de Ário é que isso levava a:
-          idéias politeístas e adoração à criatura (Jesus Cristo);
-          destrói a base da salvação por negar a divindade de Cristo.

8)      O CONCÍLIO DE NICÉIA (325 d.C.)
Cerca de 300 bispos compareceram a este concílio convocado pelo imperador Constantino. As decisões deste concílio definiram a fé da igreja até hoje sobre a Trindade e a divindade de Jesus Cristo. O credo do Concílio de Nicéia ficou assim:

Cremos em um só Deus, Pai onipotente, criador de todas as coisas visíveis e invisíveis;
e em um só Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus, gerado pelo Pai, unigênito, isto é, da substancia do Pai (ek tes oysías toy patrós), Deus de Deus, Luz de Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado, não feito, de uma só substância com o Pai (homooysion tô patrí), pelo qual foram feitas todas as coisas, as que estão no céu e as que estão na terra; o qual, por nós homens e por nossa salvação, desceu, se encarnou (sarkôthenta) e se fez homem (enanthrôpésanta), e sofreu e ressuscitou ao terceiro dia, subiu ao céu, e novamente deve vir para julgar os vivos e os mortos;
e no Espírito Santo.
E a quantos dizem: “Ele era quando não era”, e “Antes de nascer, Ele não era” ou que “foi feito do não existente (eks ouk óntôn)”, bem como a quantos alegam ser o Filho de Deus “de outra substância ou essência”, ou “feito”, ou “mutável” ou “alterável” a todos estes a Igreja Católica e Apostólica anatematiza.
(citação de Bettenson, H. Documentos da Igreja Cristã. ASTE. p. 62)

9)      OS TEÓLOGOS CAPADÓCIOS
Os teólogos capadócios são: Basílio Magno, Gregório Nazianzo e Gregório de Nissa. Eles aceitaram o credo de Nicéia e apresentaram as seguintes idéias sobre a Trindade:
-          a relação entre as pessoas da Trindade não é subordinacionista: é horizontal, ou seja, as relações são eternas e não possuem inferioridade entre as pessoas;
-          corrigem o exemplo de Tertuliano: três sóis que dão o mesmo raio.

O SIGNIFICADO DA DOUTRINA
1)      Deus é um só em seu ser essencial (ele é um em essência). Não há divisão de essência (substantia/ousia).

2)      No Ser divino há três pessoas ou subsistências pessoais ou centros de consciência: Pai, Filho, Espírito Santo:
-          Deus subsiste em três pessoas, há distinções reais na Trindade;
-          cada pessoa é autoconsciente e autodeterminante.

3)      A essência de Deus, plena, não fragmentada, pertence por igual a cada uma das três Pessoas: Deus não está dividido em pedaços.

4)      As três pessoas da Trindade, embora distintas, não formam indivíduos separados:
-          o cuidado com o uso do termo “pessoa”;
-          não se trata de triteísmo.

5)      Não há subordinação das pessoas em termos de sua natureza ou dignidade pessoal:
-          contra o subordinacionismo.

6)      Embora não haja na sua natureza diferentes graus de divindade entre os três, há distinção de funções dentro da própria Trindade:
-          o Pai não é gerado e nem procede;
-          o Filho é eternamente gerado do Pai e junto com ele envia o Espírito Santo;
-          o Espírito Santo exala (procede) do Pai e do Filho por toda a eternidade.

7)      As obras de Deus são realizadas pelas três pessoas conjuntamente (acordo absoluto em pensamentos e propósitos) embora alguns aspectos dessas obras se atenham a uma pessoa em particular.


8)      A Igreja confessa que a doutrina transcende a nossa limitada compreensão humana e é assumida por fé na revelação de Deus conforme mostrada na Bíblia e auxiliada pela razão humana.

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