A TRINDADE
Professor Whitson Ribeiro da Rocha
INTRODUÇÃO
A palavra
“Trindade” não se encontra na Bíblia, mas é a única fórmula que respeita os
dados bíblicos. Estudaremos aqui primeiramente como esta doutrina está
arraigada nas Escrituras e depois como ela se desenvolveu historicamente na
Igreja.
A TRINDADE CONFORME REVELADA NAS ESCRITURAS
1)
DEFINIÇÃO
A definição clássica de
Trindade é: Deus é um em sua essência (ousia/substantia)
e três em personalidade (hipóstases/persona).
2)
O PARADOXO
DA TRINDADE
Há duas verdades ensinadas de
modo paralelo na Bíblia:
1º) Há um único Deus: Dt 6.4; 4.39; Is 43.10-13; 44.6;
41.4; 45.5; Mc 12.29,30; Jd 25.
-
Israel era o único povo monoteísta no meio de tantos
povos politeístas;
-
a igreja sempre se viu como a continuadora da fé do
Antigo Testamento: ela adora o único Deus de Israel.
2º) Há três pessoas na condição de Deus:
-
a divindade do Pai: Jo 1.14; 5.17,18; 8.54;
-
a divindade do Filho: Jo 1.1; 20.28; 8.58,59; Rm 9.5;
Fl 2.6,10 cp. Is 45.21,23; Tt 2.13; I Jo 5.20;
-
a divindade do Espírito Santo: At 5.3,4; I Co 3.16; II
Tm 3.16 cp. II Pe 1.21.
3)
A TRINDADE
NO ANTIGO TESTAMENTO
Por que não há esta clareza
sobre o ensino da Trindade no Antigo Testamento?
-
por causa do politeísmo da época;
-
revelação progressiva do simples ao complexo;
-
Deus não se revelou de forma abstrata, mas através de
atos redentores;
-
a vinda de Jesus Cristo ao mundo é que trouxe a revelação
clara do Deus trino.
Mesmo assim observe no Antigo
Testamento:
-
Deus cria por meio da Palavra e do Espírito: Gn 1.1-3;
Jó 33.6;
-
quando vai colocar sua imagem no homem, Deus dialoga em
forma plural: Gn 1.26;
-
o Anjo do Senhor é identificado com Javé e recebe adoração:
Gn 16.7,9,13; 31.11-13; 48.15,16; Ex 3.2-4; Jz 13.21,22;
-
personificação da Sabedoria e Palavra divina: Pv
8.22-31; Jó 28.20-27; Sl 119.89;
-
referências ao Messias: Is 9.6; Mq 5.2; Sl 110.1;
45.6,7; Ml 3.1;
-
referências ao Espírito Santo: Gn 1.2; 6.3; Ex 31.3; Nm
11.24-29; Jz 3.10; Is 11.2; 32.14-17; 42.1; 48.16; 61.1; Ez 36.26,27; Jl
2.28,29;
4)
A TRINDADE
NO NOVO TESTAMENTO
A verdade sobre a Trindade está
mais fácil de ser percebida no Novo Testamento. Por quê? Sem dúvida é a pessoa
e presença de Jesus Cristo que traz à tona toda a construção do conceito de Trindade.
Esta doutrina é plenamente escrita pela Igreja para responder à seguinte
pergunta: Jesus Cristo é Deus? Se ele é Deus como entender que há um Pai com
quem ele fala e a quem serve e um Espírito que o guia e que depois ele o envia?
Por causa disso há alguns
textos no Novo Testamento que não se entendem sem a formulação da doutrina da
Trindade.
A Trindade é apresentada de
forma clara no NT:
-
Fórmulas trinitárias no NT: nascimento (Lc 1.35),
batismo (Mt 3.16,17; Lc 3.21,22), a grande comissão (Mt 28.19), a bênção
apostólica (II Co 13.13).
-
Textos trinitários no NT: Jo 1.1, 2, 18, 32-34;
8.58,59; 10.30-33; 14.9-11,16; 16.13-15;
17.5,11,21,22; I Co 8.4-6; Fl 2.5,6; Ap 1.4-8.
-
Distinção entre as pessoas divinas:
-
entre o Pai e o Filho: Jo 5.32,36,37; 1.14; 3.16;
10.36; Mc 15.34; Gl 4.4
-
o Espírito Santo distinto do Pai e do Filho: Jo
14.16,17,26; 15.26
A FORMULAÇÃO DA DOUTRINA NA HISTÓRIA DA
IGREJA ANTIGA
A formulação da doutrina da Trindade foi uma necessidade na
história da igreja pois começaram a aparecer heresias que negavam a divindade
de Jesus Cristo. A igreja começa a se perguntar acerca de como é o Deus revelado
em Cristo e nas Escrituras.
A definição que a igreja deu
com relação à Trindade no Concílio de Nicéia em 325 d.C. permanece até hoje
como a declaração da fé da igreja cristã acerca de seu Deus.
1)
OS PAIS
APOSTÓLICOS (século II d.C.)
Os pais apostólicos não
discutiram a questão da Trindade até porque não houve necessidade visto o seu
ensino estar muito próximo no tempo ao dos apóstolos. Eles criam: em um único
Deus; empregavam a fórmula trinitária, especialmente no batismo; Jesus é
chamado de Deus (Inácio).
2)
OS PAIS
APOLOGISTAS (século II d.C.)
Os pais apologistas também não
entraram nesta discussão, mas tinham a visão de Cristo como o Logos de Deus que
é a razão pela qual Deus faz e dá estrutura a este universo.
3)
TERTULIANO
DE CARTAGO (fim do século II d.C.)
-
foi o primeiro teólogo a usar o termo “Trindade”;
-
Cristo é o Logos,
é um com Deus, mas distinto do Pai (ex.: sol, raio, calor)
-
ensinou o “subordinacionismo”: o Filho está subordinado
ao Pai, o Pai é sempre maior, o Pai gera;
-
uso dos termos latinos: “persona” (indicava independência) e “substantia” (essência), desta forma ele usa a fórmula: uma
substância e três pessoas;
-
rejeitou a idéia do “patripassionismo”: o Pai sofreu na cruz.
4)
MONARQUIANISMO
(fim do século II d.C.)
Os mestre monarquistas
rejeitavam o conceito trinitário de Deus. Havia apenas um Deus que era apenas
uma pessoa. O monarquianismo foi de dois tipos diferentes.
-
Dinamista (Teodoto de Bizâncio)
sobre o homem Jesus veio, por ocasião
de seu batismo, o poder (dynamis) de
Deus e ele se torna o Cristo, um ser divinizado.
-
Modalismo (Paulo de Samosata e Sabélio)
-
Pai, Filho e Espírito Santo são de uma só substância e não
podem ser diferenciados;
-
as três pessoas são modos do único Ser Divino se
apresentar na história.
5)
A IGREJA
(fim do século II e início do século III d.C.)
Neste tempo a maioria da igreja
cristã aceita os princípios trinitários:
-
consubstancialidade do Filho com o Pai (uma “ousia” ou “substantia”);
-
três pessoas independentes (três “hypóstases” ou “personas”)
6)
ÁRIO DE
ALEXANDRIA (século III d.C.)
-
Deus é uno, indivisível e não comunica nada de seu Ser
a ninguém, logo o Filho é parte da criação;
-
Cristo é menor do que Deus e maior que o homem;
-
negava a pré-existência de Cristo: “houve tempo em que
ele não existia”;
-
os atributos divinos dados a Cristo nas Escrituras eram
funcionais, como honra que Deus lhe dava.
7)
ATANÁSIO (século
III d.C.)
O diácono Atanásio foi ferrenho
opositor de Ário e o grande defensor da Trindade. Seus argumentos contra o
ensino de Ário é que isso levava a:
-
idéias politeístas e adoração à criatura (Jesus
Cristo);
-
destrói a base da salvação por negar a divindade de
Cristo.
8)
O CONCÍLIO
DE NICÉIA (325 d.C.)
Cerca de 300 bispos
compareceram a este concílio convocado pelo imperador Constantino. As decisões
deste concílio definiram a fé da igreja até hoje sobre a Trindade e a divindade
de Jesus Cristo. O credo do Concílio de Nicéia ficou assim:
Cremos em um só Deus, Pai
onipotente, criador de todas as coisas visíveis e invisíveis;
e em um só Senhor Jesus Cristo,
o Filho de Deus, gerado pelo Pai, unigênito, isto é, da substancia do Pai (ek tes oysías toy patrós), Deus de
Deus, Luz de Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado, não feito, de uma
só substância com o Pai (homooysion tô
patrí), pelo qual foram feitas todas as coisas, as que estão no céu e as que
estão na terra; o qual, por nós homens e por nossa salvação, desceu, se
encarnou (sarkôthenta) e se fez homem
(enanthrôpésanta), e sofreu e ressuscitou
ao terceiro dia, subiu ao céu, e novamente deve vir para julgar os vivos e os
mortos;
e no Espírito Santo.
E a quantos dizem: “Ele era
quando não era”, e “Antes de nascer, Ele não era” ou que “foi feito do não
existente (eks ouk óntôn)”, bem como
a quantos alegam ser o Filho de Deus “de outra substância ou essência”, ou
“feito”, ou “mutável” ou “alterável” a todos estes a Igreja Católica e Apostólica
anatematiza.
(citação de
Bettenson, H. Documentos da Igreja Cristã.
ASTE. p. 62)
9)
OS TEÓLOGOS
CAPADÓCIOS
Os teólogos capadócios são:
Basílio Magno, Gregório Nazianzo e Gregório de Nissa. Eles aceitaram o credo de
Nicéia e apresentaram as seguintes idéias sobre a Trindade:
-
a relação entre as pessoas da Trindade não é
subordinacionista: é horizontal, ou seja, as relações são eternas e não possuem
inferioridade entre as pessoas;
-
corrigem o exemplo de Tertuliano: três sóis que dão o
mesmo raio.
O SIGNIFICADO DA DOUTRINA
1)
Deus é um só em seu ser essencial (ele é um em
essência). Não há divisão de essência (substantia/ousia).
2)
No Ser divino há três pessoas ou subsistências pessoais
ou centros de consciência: Pai, Filho, Espírito Santo:
-
Deus subsiste em três pessoas, há distinções reais na
Trindade;
-
cada pessoa é autoconsciente e autodeterminante.
3)
A essência de Deus, plena, não fragmentada, pertence
por igual a cada uma das três Pessoas: Deus não está dividido em pedaços.
4)
As três pessoas da Trindade, embora distintas, não
formam indivíduos separados:
-
o cuidado com o uso do termo “pessoa”;
-
não se trata de triteísmo.
5)
Não há subordinação das pessoas em termos de sua
natureza ou dignidade pessoal:
-
contra o subordinacionismo.
6)
Embora não haja na sua natureza diferentes graus de
divindade entre os três, há distinção de funções dentro da própria Trindade:
-
o Pai não é gerado e nem procede;
-
o Filho é eternamente gerado do Pai e junto com ele
envia o Espírito Santo;
-
o Espírito Santo exala (procede) do Pai e do Filho por
toda a eternidade.
7)
As obras de Deus são realizadas pelas três pessoas
conjuntamente (acordo absoluto em pensamentos e propósitos) embora alguns
aspectos dessas obras se atenham a uma pessoa em particular.
8)
A Igreja confessa que a doutrina transcende a nossa
limitada compreensão humana e é assumida por fé na revelação de Deus conforme
mostrada na Bíblia e auxiliada pela razão humana.
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